'Sofro bullying virtual, me
chamam de sapatão', afirma Rebeca Gusmão
Domingo, 30 de Novembro de 2014
Logo que
sentei para conversar com a agora loira Rebeca Gusmão em uma tarde fria e
chuvosa em Brasília, ela sacou um iPhone da bolsa. No restaurante em que
almoçávamos, mostrou para mim, orgulhosa, uma foto em que aparecia vestida de
maiô e touca ao lado da irmã mais velha, na beira de uma piscina. O semblante
sério da pequena nadadora, então com 9 anos, revela muito sobre sua relação com
o esporte: desde a mais tenra idade, foi treinada para vencer.
Rebeca
começou a nadar profissionalmente aos 12 anos em um clube de Brasília, cidade
onde nasceu. Depois de apenas três meses de treino puxado, tornou-se a melhor
do mundo em sua categoria e conquistou a primeira medalha de ouro, em um
campeonato na África do Sul. “Foi uma surpresa”, disse durante a conversa. “Essa
medalha estava prevista para vir após três ou quatro anos de treinos.”
Passada a
estreia arrebatadora, começou a quebrar os próprios recordes numa escalada
incessante e rapidamente tornou-se o maior nome feminino da natação brasileira
e a primeira mulher com chances reais de ganhar um ouro em Olimpíadas na
modalidade.
Em dez
anos de carreira, diz que ganhou mais de 1.500 medalhas. Entram nessa conta as
quatro obtidas nos Jogos Pan-americanos do Rio de Janeiro, em 2007. Mas esses
títulos foram retirados dela depois que exames deram positivo para uso de
anabolizantes e esteroides – resultado que ela contesta até hoje. Naquele
momento, Rebeca, com 22 anos, viu sua carreira ruir. Foi suspensa pela
Federação Internacional de Natação e nunca mais pôde competir em piscinas. Em
2009, foi proibida de praticar qualquer tipo de esporte profissionalmente pela
Corte de Arbitragem do Esporte – na época, jogava futebol em um clube de
Brasília.
Sem saber o que fazer da vida,
saiu candidata a deputada distrital pelo PCdoB em 2010. Sua votação foi
irrisória – teve apenas 437 votos. Arrumou, então, um emprego na Secretaria de
Esportes do Distrito Federal, onde deu expediente até meados de setembro. Pediu
demissão quando boatos de que participaria do reality show "A
Fazenda", da TV Record, começaram a circular. Não foi escalada para a
formação inicial do programa. Agora, dedica-se às carreiras de modelo fitness e
palestrante motivacional.
Longe das
piscinas, Rebeca começou a descontar as frustrações na comida. Em três anos,
engordou 30 quilos. Sua saúde mental piorou ainda mais em 2013, quando o marido
deu fim ao casamento de seis anos. Em agosto do ano passado, entrou em coma por
ter ingerido antidepressivos misturados com bebidas alcoólicas. O episódio foi
o ponto de virada para a assombrosa recuperação, detalhada por ela – em meio a
outros escândalos – na entrevista a seguir.
Ela conta
ainda que sua sexualidade é motivo de ataques: "É muito triste julgarem pela
aparência. Isso é coisa de gente covarde, invejosa. No esporte, quando
desconfiam da sua identidade sexual, te obrigam a fazer um exame de
feminilidade. Felizmente nunca fui chamada para fazer um desses. Já fiz milhões
de controles de doping, mas de feminilidade, nunca. E até hoje sou vítima de
bullying virtual: me chamam de sapatão, dizem que sou homem, que pareço o Hulk,
que se eu for para a cama com um cara eu que vou comê-lo. Essas pessoas têm que
procurar ajuda. Quem perde tempo e energia com esse tipo de coisa?".
FOTOS:
Fotos extraídas do Google com matéria do 180 Graus