Domingo, 20 de novembro de 2016
O corpo franzino e os traços
infantis no rosto de Ana (fictício) revelam a transição da infância para a
adolescência. Para a garota, de 14 anos, essa nova fase, por vezes complicada e
cheia de mudanças, virá com a responsabilidade de cuidar da pequena Laura (fictício),
de apenas 10 dias de nascida. Ana está no universo de meninas, de até 15 anos,
que todos os anos dão a luz a cerca de 500 bebês na Paraíba.
De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), de 2004 até 2014, 5.499 mil crianças nasceram de meninas de
até 15 anos na Paraíba. Ou seja, 499,9 partos feitos, anualmente, em mulheres
nessa faixa etária. A trajetória de Ana é a mesma de Flávia (fictício). As duas
iniciaram a vida sexual aos 12 anos e, aos 13, Flávia tinha uma criança no
ventre. O ar infantil da menina que embala um bebê se mistura à maquiagem da
mulher que teima em antecipar as responsabilidades da vida adulta.
“Tudo é novidade para mim. A sorte que minha mãe e minha irmã me
ajudam a cuidar dele”, relatou a mãe do pequeno Luis (fictício), de apenas sete
dias.
O desconhecimento sobre os métodos contraceptivos é um dos
fatores que estão presentes na realidade da maioria das adolescentes que ficam
gestantes. Essa situação pode gerar outros agravantes, como problemas de saúde
para a mãe e o bebê. Um estudo feito por um grupo de pesquisa em Saúde Pública
da Universidade de São Paulo apresentado à Sociedade Paulista de Pediatria
(SPP) mostrou que problemas relacionados à gestação, parto ou pós-parto
ocasionaram a internação de 59,5% de mulheres, na faixa etária dos 15 anos 19
anos, em todo o País.
Embora os dados do estudo sejam de 2014, essa é uma realidade
contínua, segundo explicou o ginecologista e obstetra do Instituto Cândida
Vargas de João Pessoa, Genival Ferreira de Lima. “O pré-natal de uma mãe
adolescente necessita de mais cuidado e acompanhamento, porque é uma gravidez
de risco. Tem que explicar para elas a importância de tomar as medicações,
fazer os exames para evitar problemas, como infecção urinária. Como a parte
hormonal delas ainda é deficitária, elas têm uma predisposição maior em ter
esse problema”, alertou.
Educação sexual
Para a coordenadora do Núcleo de Estudos de Violência Doméstica contra Criança
e Adolescente da Sociedade Paulista de Pediatria, Renata Waksman, a gravidez
indesejada que afeta muitas adolescentes é reflexo da falta de educação sexual
também em casa, com a família. Ela reforça a falta de maturidade das jovens ao
não ter responsabilidade em usar os métodos contraceptivos e ainda o retardo em
procurar acompanhamento médico, quando engravidam. “A atividade sexual dos
adolescentes está começando cada vez mais cedo. Muitas vezes, as adolescentes
engravidam e não sabem.
Fazem o pré-natal tarde ou de maneira inadequada. Tudo isso traz
agravantes para a saúde. A orientação de como se cuidar e os perigos que se tem
nas relações sexuais é papel dos pais e não somente da escola. Os pais não
podem esperar a menina menstruar ou começar a namorar para falar sobre isso”,
reforçou.
A reportagem entrou em contato com a Secretaria de Estado da
Saúde (SES) para comentar os dados mas, até o fechamento desta edição, não
obteve resposta.
Dois
partos por dia na Capital
Até setembro deste ano foram realizados 589 partos em adolescentes que deram
entrada no Instituto Cândida Vargas, em João Pessoa. Com a média de dois partos
por dia feitos em gestantes na faixa etária dos 11 aos 17 anos, o supera o
total de procedimentos em mulheres de 18 e 19 anos.
Do Jornal
Correio da Paraíba