Sábado, 17 de junho de 2017
Três
dias depois de uma reunião executiva do partido decidir — sem votação nominal —
sobre a permanência do PSDB no governo enquanto não surgirem fatos novos que
possam agravar a situação do governo de Michel Temer, o presidente de honra do
partido, Fernando Henrique Cardoso, incendiou o debate. Ele questionou a
autoridade que o peemedebista tem hoje, alertou para um movimento vindo das
ruas pedindo antecipação do processo eleitoral e usou, novamente, a metáfora
que adora, da qual esse governo é um pinguela. “Preferiria atravessar a
pinguela, mas, se ela continuar quebrando, será melhor atravessar o rio a nado
e devolver a legitimação da ordem à soberania popular”, disse ele.
As palavras do presidente repercutiram
intensamente nas hostes tucanas. O partido ainda está cindido desde a última
segunda-feira. Até a reunião da Executiva, apenas os cabeças-pretas, liderados
pelo deputado Daniel Coelho (PE), defendiam ostensivamente o rompimento. No
encontro, o racha aumentou, com o próprio presidente interino do partido, Tasso
Jereissatti, do Ceará, e o senador Ricardo Ferraço (ES), relator da reforma
trabalhista no Senado, admitindo que se posicionaram a favor do rompimento, mas
acataram a decisão da maioria.
“Agora, além dos cabeças-pretas e dos
cabeças-brancas, teremos o grupo dos votos vencidos, puxado por Tasso, Ferraço
e o próprio Fernando Henrique Cardoso. Esse grupo tende, cada vez mais, a
tensionar o debate com o restante da legenda”, afirmou um tucano que participou
ativamente da reunião da Executiva Nacional. A sensação de paralisia do governo
Temer, nas últimas semanas — interrompida apenas pela votação da reforma
trabalhista na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) e por alguns indicadores
positivos da economia — aumenta a angústia de um grupo cada vez maior de
tucanos. “A Câmara não vota nada. A cada dia surgem fatos novos, aviões,
helicópteros. Isso aumenta a sensação de desconforto”.
Esse quadro é classificado por Fernando
Henrique como anomia — ausência de lei ou de regra, desvio das leis naturais,
anarquia, desorganização segundo o dicionário. “A conjuntura política do Brasil
tem sofrido abalos fortes e minha percepção também. Se eu me pusesse na posição
de presidente e olhasse em volta, reconheceria que estamos vivendo uma quase
anomia. Se tudo continuar como está, com a desconstrução contínua da
autoridade, pior ainda, se houver tentativas de embaraçar as investigações em
curso, não vejo mais como o PSDB possa continuar no governo”, completou FHC.
“Grandeza”
O ex-presidente reconheceu que o atual momento
político está amparado na legalidade e nas regras constitucionais, o que, em
tese, transformaria em golpe um pedido de eleições gerais antecipadas. Em tese.
“Não havendo aceitação generalizada de sua validade (da autoridade
presidencial), ou há um gesto de grandeza por parte de quem legalmente detém o
poder pedindo antecipação de eleições gerais, ou o poder se erode de tal forma
que as ruas pedirão a ruptura da regra vigente exigindo antecipação do voto”,
defendeu Fernando Henrique.
A manutenção do apoio ao governo foi possível
graças à costura feita pelos governadores do partido — especialmente Geraldo
Alckmin (São Paulo) e Marconi Perillo (Goiás). O argumento apresentado por eles
é a defesa da estabilidade econômica, afirmando que uma ruptura institucional
neste momento abafaria os pálidos sinais de recuperação econômica. Tanto
Alckmin quanto Perillo estiveram com Temer em um jantar na terça-feira, quando
foi acertado o repasse de R$ 50 bilhões de linha de financiamento do Banco
Nacional de Desenvolvimento (BNDES) para obras de infraestrutura.
"Se tudo continuar como está, com a
desconstrução contínua da autoridade, pior ainda, se houver tentativas de
embaraçar as investigações em curso, não vejo mais como o PSDB possa continuar
no governo”.
Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente.
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