Domingo, 03 de setembro de 2017
Declarações do empresário foram uma reação à
nota do Palácio do Planalto que o chamou de 'grampeador-geral da República'
Empresário Joesley Batista, um dos donos
da J&F Foto: AYRTON VIGNOLA/ESTADÃO
BRASÍLIA - O empresário Joesley Batista, do grupo JBS, chamou
o presidente Michel Temer de “ladrão geral da República” e disse que ele
“envergonha” todos os brasileiros. Delator da Lava Jato, Joesley afirmou em
nota que a colaboração premiada é um direito e que o ataque a essa prerrogativa
revela a “incapacidade” de Temer se defender “dos crimes que comete.”
As declarações do empresário foram uma resposta a outra nota,
divulgada na sexta-feira, 1, pela Secretaria de Comunicação da Presidência
(Secom), na tentativa de criar uma “vacina” à nova denúncia que a
Procuradoria-Geral da República promete apresentar contra Temer. Na ocasião, o
Palácio do Planalto desqualificou o operador Lúcio Funaro, que firmou acordo de
delação com o Ministério Público, e se referiu a Joesley como “grampeador geral
da República.”
“A colaboração premiada é por lei um direito que o senhor presidente
da República tem por dever respeitar. Atacar os colaboradores mostra no mínimo
a incapacidade do senhor Michel Temer de oferecer defesa dos crimes que comete.
Michel, que se torna ladrão geral da República, envergonha todos nós
brasileiros”, respondeu Joesley, em nota.
O advogado Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, defensor de Temer,
disse que a declaração do empresário “não merece nenhuma resposta em face da
sua origem e do conhecido comportamento absolutamente reprovável do delator”. O
depoimento de Joesley - que gravou conversa com Temer, no Palácio do Jaburu -
serviu como base para a primeira denúncia apresentada contra o presidente pelo
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, por corrupção passiva.
“A resposta já foi dada pela Câmara dos Deputados, que rejeitou a
denúncia baseada na acusação dessa mesma pessoa”, afirmou Mariz.
ESTRATÉGIA
Na expectativa de uma nova acusação, Temer decidiu antecipar a
estratégia de forte reação política ao conteúdo da delação de Funaro, ainda sob
sigilo. O Estado apurou que as acusações do operador atingem não apenas Temer
como outras figuras de expressão no PMDB, com potencial para aumentar a crise
no governo. Diante desse cenário, deputados do Centrão - grupo que reúne
partidos médios - estão exigindo a cadeira do ministro da Secretaria de
Governo, Antonio Imbassahy (PSDB), responsável pela articulação política, para
renovar o apoio a Temer.
A Secom afirmou, na sexta-feira, que Temer se reserva
o direito de não tratar de “ficções e invenções”. Argumentou, ainda, que
a "suposta segunda delação" de Funaro apresenta
"inconsistências e incoerências próprias de sua trajetória de crimes"
e insinua uma parceria entre ele e Joesley.
Para o Palácio do Planalto, Joesley “mentiu” e omitiu fatos em sua
delação e, mesmo assim, “continua tendo o perdão eterno” de Janot. “Prêmio
igual ou semelhante será dado a um criminoso ainda mais notório e perigoso como
Lúcio Funaro?”, questionou a nota da Secom.
A nota destaca que Funaro foi preso há um ano por "ameaçar de
morte" a seus ex-parceiros comerciais e diz não estar claro como se deu
sua "conversão" diante de Janot. Em tom de ironia, a nota pergunta
qual "mágica" teria feito o operador, "que traiu a confiança da
Justiça e do Ministério Público", ganhar agora credibilidade.
"Diante da vontade inexorável de perseguir o presidente da
República, Funaro transmutou-se em personagem confiável. Do vinagre, fez-se
vinho. Quem garante que, ao falar ao Ministério Público, instituição que já
traiu uma vez, não o esteja fazendo novamente?", indaga a nota. "Se
era capaz de ameaçar a vida de alguém para escapar da Justiça, não poderia ele
mentir para ter sua pena reduzida? Isso seria, diante de sua ficha corrida, até
um crime menor."
O Palácio do Planalto recebeu informações de que a denúncia de
Janot contra Temer será, desta vez, por obstrução de Justiça. Na nota, a Secom
menciona o diálogo gravado clandestinamente por Joesley para sustentar que o
presidente "jamais" obstruiu a Justiça.
"A gravação usada pelo seletivo acusador desmente a acusação.
Outro agravante é o fato de o grampeador-geral da República ter omitido o
produto de suas incursões clandestinas ao Ministério Público. No seu gravador,
vários outros grampos foram escondidos e apagados. Joesley mentiu, omitiu e
continua tendo o perdão eterno do procurador-geral. Prêmio igual ou semelhante
será dado a um criminoso ainda mais notório e perigoso como Lúcio
Funaro?", provoca a nota.
A primeira denúncia contra Temer, por corrupção passiva, foi
rejeitada pelo plenário da Câmara em 2 de agosto e a segunda acusação deve ser
apresentada nos próximos dias por Janot, que deixa o cargo no próximo dia 17.
Na contra-ofensiva, o presidente disse que os irmãos Batista refizeram sua
delação, "demonstrando terem mentido e omitido fatos, sobretudo em relação
às falcatruas com o BNDES".
Na avaliação do Planalto, os delatores prestaram falso testemunho
na Operação Bullish e puderam, "camaradamente", 'corrigir' suas
mentiras ao procurador-geral. "Sem um puxão de orelhas sequer", diz o
texto divulgado pela Secom.
Vera Rosa, Lígia Formenti,
Rafael Moraes Moura, O Estado de S.Paulo