Quinta-feira, 07 de dezembro de 2017
Pela segunda
vez, o Brasil entrou para o time de países que participa do Levantamento Global
de Drogas (GDS, sigla em inglês), uma pesquisa online, cujo objetivo é mapear o
consumo de substâncias no mundo todo. Segundo os novos dados divulgados com
exclusividade ao UOL, cerca de 8,5% dos usuários de maconha -- quase 10% --
afirmam passar 12 horas sob o efeito da droga, após uso recorrente da
substância ao longo dia.
“Essa revelação tem a ver com a alta concentração de THC [principal componente
responsável pelo efeito psicotrópico] presente na maconha consumida no Brasil,
que gera dependência da droga. São mais de 10%”, conta Clarice Madruga,
pesquisadora da UNIFESP e coordenadora brasileira do estudo. Como comparativo,
ela conta que a liberada para uso recreativo no Uruguai, tem teto máximo
estabelecido de 2% de tetrahidrocanabinol.
Os
efeitos da maconha aditivada
“Quanto mais aditiva, maiores a
chances de se viciar. Hoje, já sabemos que 46,7% dos usuários preferem a de
alta potência, e que a erva vendida no mercado nacional não possui o
canabidiol, substância de princípio terapêutico.”
Entre os efeitos negativos, a pesquisadora cita ainda o aumento de chances de
desenvolver transtornos de ansiedade e depressão, de desencadear ataques de
pânico e de tentativas de parar sem sucesso.
Nesta edição, participaram 3 mil brasileiros, com idade média de 30 anos. E a
maconha só perde para o álcool na lista de substâncias mais consumidas no país.
Enquanto a erva é usada por 44,9% dos participantes, a bebida alcoólica foi
citada por 88% deles. A cocaína aparece em terceiro lugar, com 9,7%.
O novo fenômeno da cannabis sintética
Além da
versão aditivada, a pesquisa mostrou que a maconha sintética também tem sido
muito consumida pelos usuários brasileiros. “Trata-se de uma molécula de THC
sintetizada em laboratório que não tem nada a ver com a planta”, explica
Clarice. “Ao ser sintetizada, a substância provoca uma conexão diferente no
cérebro, tornando o efeito ainda mais nocivo. Não à toa, ela leva hoje mais
pessoas à emergência do que qualquer outra droga consumida no país. Mais até
que a metanfetamina.”
Exatamente por isso, em nenhum país onde a maconha já foi descriminalizada, a
sintética é liberada. “Ela continua sendo vendida no mercado ilegal”, conta a
pesquisadora.
Compra pela internet surpreende
Entre os
novos padrões de consumo que mais se destacaram, Clarice cita o aumento da
compra de drogas ilícitas pela internet, especialmente pela “Darknet” e
“Deepweb”. “Essa ferramenta tem tornado o acesso cada vez mais fácil. Isso leva
muita gente a cair em golpes e saber cada vez menos sobre a composição da
substância que se compra”, diz.
O consumo de drogas pelas mulheres
Correspondendo
a 44,4% das entrevistadas, as mulheres brasileiras se destacam como as maiores
consumidoras de inibidores de apetite no mundo. “Essa é a droga mais usada por
elas. Em seguida, vem o álcool”, conta Clarice.
Segundo a especialista, a percepção subjetiva sobre o grau de embriaguez entre
as brasileiras é preocupante. “Até o ano passado, as participantes relataram
precisar em média de 16 unidades de álcool para se sentirem bêbadas, o
correspondente a 8 garrafas de cerveja. Isso tem mostrado o quão nocivo beber
tem se tornado”, diz. Os homens alegam precisar de 22 doses.
O consumo de cocaína preocupa
Pelo segundo
ano consecutivo, o Brasil é o país onde há a maior procura por serviços de
emergência pelo uso de cocaína. Clarice explica que essa posição está
relacionada ao baixo custo do pó no país. “Só é mais cara do que na Colômbia”,
conta. Por aqui, cobra-se 9,4 euros (R$ 32) por grama, enquanto no país
vizinho, a mesma quantidade sai por 3,5 euros (R$ 13).
A sua pureza
também é um agravante quanto aos efeitos nocivos provocados pela droga, como
ataque cardíaco, crise de pânico e aquecimento. “Por estarmos geograficamente
próximos dos mercados exportadores, recebemos uma versão pouco adulterada e,
consequentemente, com alto poder estimulante.” Cerca de 24,3% dos usuários de
cocaína disseram que gostariam de receber ajuda para parar com o uso.
“Antes de qualquer descriminalização, é preciso regulamentar”
Para
Clarice, dados como esses contribuem para uma futura tomada de decisão quanto à descriminalização, que exige uma regulamentação prévia baseada
em evidências. “Levantamentos como esse, que se voltam a padrões de consumo,
são fundamentais para uma tomada de decisão quanto a políticas públicas”, diz.
A coleta de dados para o ano de 2018 já está aberta. Os interessados, com mais
de 16 anos, podem responder ao questionário no site da GDS até janeiro.
UOL