Segunda-feira, 04 de dezembro de 2017
66% se dizem “totalmente contra” o aborto quando a gravidez não
é planejada
Uma
pesquisa lançada nesta segunda-feira (4) aponta em quais casos o brasileiro é
favorável ao aborto, ao ser confrontado com diferentes situações concretas
vivenciadas pelas mulheres. Entre os entrevistados, 81% dos participantes da
consulta afirmaram que concordavam com a interrupção em, ao menos, um dessas
situações: em caso de uma gravidez não planejada; falta de condições para
criar; no caso de meninas com até 14 anos; se o feto for diagnosticado com
alguma doença grave ou incurável; se a mulher correr risco de vida ou caso ela
tenha ficado grávida após ser vítima de um estupro.
Tendo
em vista cada uma das situações, o maior índice de apoio à interrupção se dá
quando a gravidez resulta de um estupro: 59% dos entrevistados se dizem
“totalmente a favor”. Se a mulher correr risco de morte na gestação e/ou no
parto, o índice passa para 48%. O número chega a 41% quando o feto for
diagnosticado com alguma doença grave e incurável, como quando a mulher contrai
zika durante a gestação, comprometendo o desenvolvimento neurológico do bebê.
Os
percentuais de apoio diminuem nas situações em que se trata de meninas com até
14 anos grávidas (27%); se a família não tiver condições de criar (19%) e em
caso de uma gravidez não planejada (11%). O maior índice de rejeição à
interrupção é exatamente neste último caso: 66% se dizem “totalmente contra” o
aborto quando a gravidez não é planejada.
Intitulada
“Percepções sobre o aborto no Brasil”, a pesquisa foi realizada pelo Instituto
Locomotiva e pela Agência Instituto Patrícia Galvão, em 12 regiões
metropolitanas do Brasil, entre os dias 27 de outubro e 6 de novembro. Foram
ouvidas 1.600 pessoas, entre homens e mulheres com 16 anos ou mais. O estudo
indica que, quando as situações não são explicitadas, a maior parte das pessoas
se diz contra o aborto. Questionados sobre “o quanto é a favor ou contra que as
mulheres possam decidir por interromper a gravidez”, 62% dos participantes se
disseram contrários; 26%, a favor; 10%, nem contra, nem a favor; e 2% não
sabiam ou não responderam.
Contradições
O
estudo revela que, entre aqueles que se disseram contrários ao aborto de uma
forma geral, 75% são favoráveis a que a mulher possa interromper a gravidez em
ao menos uma das situações listadas. A aparente contradição é, na opinião da
diretora-executiva da Agência Patrícia Galvão, Jacira Melo, uma consequência da
forma como o tema é tratado no Brasil. “Quando você coloca o aborto em
determinadas situações muito reais e concretas, você vê que as respostas
caminham para o lado da racionalidade, da realidade. A população demonstra mais
flexibilidade, um olhar mais atencioso para o problema, que é um problema de
saúde pública”, afirma.
A
pesquisa aponta ainda uma relação entre a opinião sobre o aborto e a
escolaridade do entrevistado. O número de pessoas favoráveis à interrupção da
gravidez acompanha o crescimento do nível de escolaridade. Entre as que têm o
ensino superior completo, 35% disseram ser favoráveis ao aborto. Já o grupo de
pessoas que têm até o ensino fundamental completo é o que registra maior índice
de rejeição à interrupção da gravidez: 67%.
Pessoas
conhecidas
Um
dado inédito trazido pela pesquisa aponta que 45% dos entrevistados conhecem
uma mulher que realizou um aborto ou interrompeu a gravidez. Em números
absolutos, o percentual corresponde a 72 milhões de brasileiros com mais de 16
anos. Do total, 25% afirmaram que a conhecida que interrompeu uma gravidez é
uma pessoa próxima e 16% afirmaram não ser “uma mulher não tão próxima”.
Quando
analisado o gênero dos entrevistados, a pesquisa conclui que mais mulheres do
que homens afirmam conhecer alguém que já realizou um aborto. São 52% no caso
das mulheres e 34% no dos homens. “Nós estamos falando exatamente dessa
questão: ao pé do ouvido, as pessoas estão falando do tema do aborto, sobretudo
as mulheres”, alerta Jacira. Para a diretora da Agência Patrícia Galvão, “se
esse tema fosse mais debatido, menos interdito na sociedade, nós teríamos outra
posição”.
Criminalização
A
pesquisa também investigou a percepção das pessoas sobre a criminalização da
prática do aborto. Questionados se “uma mulher que interrompe a gravidez
intencionalmente deveria ir para a cadeia”, 50% concordam e 38% discordam.
Porém, quando se trata de alguém próximo como uma amiga que tenha feito aborto,
47% das pessoas não fariam nada e somente 7% chamariam a polícia.
A
abordagem policial da questão não é considerada a mais apropriada, na opinião
da maior parte dos brasileiros. Cerca de 8 em cada 10 entrevistados afirmam que
a discussão sobre aborto no Brasil é uma questão de saúde pública ou de
direitos, enquanto apenas 1 em cada 10 acreditam que seria um "assunto de
polícia".
PEC
181
Atualmente
em discussão na Câmara dos Deputados, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC)
181/2015, que tratava inicialmente da ampliação da licença-maternidade para
mães com bebês prematuros, inclui dispositivos que podem abrir a possibilidade
de proibir todas as formas de aborto no país, inclusive nos casos considerados
legais atualmente, como o aborto. Inicialmente, o texto tratava somente da
ampliação da licença-maternidade para mães com bebês prematuros.
No
Brasil, o aborto é legalmente permitido em três casos: quando não há meio de
salvar a vida da mãe, quando a gravidez resulta de estupro e quando o feto é
anencéfalo. De acordo com a Pesquisa Nacional do Aborto 2016, feita por
pesquisadoras da Universidade de Brasília (UnB), apenas em 2015, 500 mil
mulheres realizaram um aborto ilegal. O número pode ser maior, já que muitas
pessoas praticam o aborto sozinhas e não comunicam o fato.
Agência Brasil