Domingo, 07 de julho-(07) de 2024
Matéria da Agência Brasil
A
diminuição dos gastos públicos entrou no centro do debate político e econômico
nos últimos dias. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já anunciou a
necessidade de cortes nas despesas obrigatórias para o cumprimento da Lei do
Arcabouço Fiscal, mas não especificou as áreas que serão atingidas.
Segundo o ministro, as medidas de contingenciamento e
bloqueio serão divulgadas no dia 22 de julho, mesmo dia da publicação do
Relatório Bimestral de Receitas e Despesas, elaborado pela Receita Federal. Até
lá, a discussão sobre as áreas em que devem ocorrer os cortes tende a se
intensificar.
A Previdência Social costuma ser uma das áreas mais
visadas. No entanto, a ideia de desvincular o piso previdenciário do
salário mínimo é criticada pelo advogado e contador Álvaro Sólon de França,
ex-secretário executivo do Ministério da Previdência e ex-presidente do
Conselho Executivo da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita
Federal do Brasil (Anfip).
Para ele, o governo deveria reverter a desoneração de
imposto em vez de pensar em diminuir valor de benefícios. “A desvinculação do
salário mínimo dos benefícios previdenciários e assistenciais é um ajuste
fiscal em cima da classe mais pobre. Vamos aumentar a pobreza e a desigualdade
social no Brasil.”
França, que prepara seu terceiro livro sobre a
Previdência Social, disse à Agência
Brasil que os benefícios previdenciários e assistenciais
não vão para a poupança, nem para aplicação no mercado financeiro. “Eles vão
diretamente para o consumo e a circulação do dinheiro que provoca a melhoria da
qualidade de vida.”
O especialista assinala que, na média, cada beneficiário
recebe R$ 1.744 e que oito de cada dez benefícios pagos pela Previdência Social
tem o valor de um salário mínimo. Assim, a desvinculação do mínimo teria efeito
recessivo e ainda poderia diminuir a arrecadação de tributos em cima do consumo
desses beneficiários – o que geraria desequilíbrio fiscal.
Outro efeito seria o impacto nas contas de 4.101
municípios – 73% das 5.568 cidades brasileiras, nas quais os recursos oriundos
da Previdência Social têm volume maior do que os repasses do Tesouro Nacional
ao Fundo de Participação dos Municípios.
Proposta de emenda
Artigo de economistas ligados à Universidade Federal de
Minas Geraus, publicado em março na revista Pesquisa
e Planejamento Econômico, editada pelo Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (Ipea), também alerta para os possíveis efeitos sociais do
corte de benefícios.
O texto analisa a versão original da Proposta de Emenda à
Constituição (PEC) 6/2019 que, à época, estabelecia o pagamento do benefício de
prestação continuada (BPC) a partir dos 60 anos, mas com valor de R$ 400. O
valor de um salário mínimo (então R$ 998) somente seria pago aos 70 anos, cinco
anos depois da idade, como permanece em vigor.
Os autores – Débora Cardoso, Edson Paulo Domingues, Luís
Eduardo Afonso e Guilherme Cardoso – concluem que o corte de pagamentos do BPC
proposto na proposta “seria bastante regressivo, impactando fortemente as
famílias de menor renda.”
Quanto a pensões e aposentadorias do Regime Geral de
Previdência Social, eventuais cortes podem ser “positivos, ou menos negativos”,
a depender do destino do dinheiro poupado, se, por exemplo, se adota uma
suposição de resposta mais forte do investimento. O artigo defende, no entanto,
que eventuais cortes em benefícios de servidores ativos e aposentados inscritos
em regimes próprios de previdência social teriam “caráter progressivo” e
diminuiriam a desigualdade.
Divergência
O Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de
2025, em tramitação no Congresso Nacional, prevê que o Regime Geral de
Previdência Social terá arrecadação de R$ 709,1 bilhões, e o pagamento de
benefícios previdenciários será de R$ 980,9 bilhões. Um déficit de R$ 271,8
bilhões, que impacta no resultado primário das contas públicas.
De acordo com estimativa do PLDO, o salário mínimo
passará dos atuais R$ 1.412 para R$ 1.502. Os R$ 90 de diferença trarão impacto
de R$ 51,2 bilhões, cerca de um quinto do déficit previdenciário, conforme nota
técnica das consultorias de Orçamento da Câmara dos Deputados e do Senado
Federal.
Na avaliação do pesquisador associado do Instituto
Brasileiro de Economia, unidade da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV) Bráulio
Borges, também economista sênior da área de macroeconomia da LCA Consultores, a
Previdência Social é “a principal rubrica que deve ser ‘atacada’ para restaurar
o equilíbrio fiscal brasileiro.”
Em artigo recente, o economista opina que “um elemento
crucial” para conter a expansão do déficit previdenciário seria desvincular o
piso previdenciário, o BPC e outros benefícios assistenciais do salário mínimo
nacional.
“O salário mínimo é uma variável que deve, sim, ser
reajustada ao longo do tempo em termos reais, refletindo ganhos de
produtividade da mão de obra, mas é uma variável que deve regular o mercado de
trabalho, ou seja, a vida de quem está participando ativamente da produção
econômica. As aposentadorias e pensões deveriam ser reajustadas apenas pela
inflação, mantendo o poder de compra ao longo do tempo”, afirma Borges.
No texto, o especialista ainda defende o incremento da
arrecadação com a futura cobrança do futuro Imposto Seletivo sobre produtos que
impactam a saúde e o meio ambiente, e pondera que “alguns subsídios explícitos
para o setor agropecuário (como equalização de juros do Plano Safra, dentre
outros) poderiam ser reduzidos, uma vez que o setor já é altamente competitivo
com “as próprias pernas”.
Por: Agência
Brasil