Terça-feira, 12 de abril-04 de 2022
Empresas
oferecem chips de pagamento injetados sob a pele, que podem ser usados para
pagar contas como um cartão de débito ou crédito comum.
Uma mulher pagando sua refeição em um café usando um chip de pagamento sem contato implantado em sua mão. (Foto: PIOTR DEJNEKA)
O holandês Patrick Paumen, de 37 anos, causa rebuliço sempre que paga
por algo em uma loja ou restaurante.
Ele não precisa usar dinheiro, cartão de banco ou celular para pagar. Em
vez disso, ele simplesmente coloca a mão esquerda perto do leitor de cartão e o
pagamento é realizado.
"As reações que recebo dos caixas são impagáveis", diz Paumen,
que trabalha como guarda de segurança.
Ele consegue pagar usando apenas sua mão porque em 2019 ele teve um
microchip de pagamento injetado sob a pele.
"O procedimento dói tanto quanto quando um beliscão na pele",
diz Paumen.
A primeira vez que um microchip foi implantado em um ser humano foi em
1998, mas foi apenas na última década que essa tecnologia ficou disponível
comercialmente.
A empresa anglo-polonesa Walletmor diz que se tornou, no ano passado, a
primeira empresa a colocar à venda chips de pagamento implantáveis.
Paumen tem um chip sob a pele da mão esquerda que acende quando entra em contato próximo com uma máquina de pagamento — Foto: PATRICK PAUMEN
"O implante pode ser usado para pagar uma
bebida na praia do Rio, um café em Nova York, um corte de cabelo em Paris — ou
no supermercado local", diz o fundador e presidente-executivo Wojtek
Paprota.
"Ele pode ser usado onde quer que
pagamentos sem contato sejam aceitos."
O chip de Walletmor, que pesa menos de um
grama e é pouco maior que um grão de arroz, é composto por um minúsculo
microchip e uma antena envolta em um biopolímero — um material de origem
natural, semelhante ao plástico.
Paprota diz que o chip é totalmente seguro, tem aprovação regulatória e
funciona imediatamente após ser implantado. Também não requer bateria ou outra
fonte. A empresa diz que já vendeu mais de 500 chips.
A tecnologia que a Walletmor usa é a
comunicação de campo próximo ou NFC, em inglês - o sistema de pagamento por
aproximação em smartphones. Outros implantes de pagamento são baseados em identificação
por radiofrequência (RFID), que é a tecnologia similar normalmente encontrada
em cartões de débito e crédito físicos por aproximação.
Para muitos de nós, a ideia de ter um chip
implantado em nosso corpo é horrível, mas uma pesquisa de 2021 com mais de 4
mil pessoas no Reino Unido e na União Europeia descobriu que 51% considerariam
fazer um implante.
Um raio-x mostrando um implante Walletmor, que é injetado na mão de uma pessoa após um anestésico local — Foto: WALLETMOR
No entanto, sem fornecer uma porcentagem, o
relatório acrescentou que "questões de invasão e segurança continuam sendo
uma grande preocupação" para os entrevistados.
Paumen diz que não tem nenhuma dessas
preocupações.
"Os implantes de chip contêm o mesmo tipo
de tecnologia que as pessoas usam diariamente", diz ele, "desde
chaveiros a destrancar portas, cartões de transporte público como o cartão
Oyster [do transporte público de Londres] ou cartões bancários com função de
pagamento sem contato."
"A distância de leitura é limitada pela
pequena bobina da antena dentro do implante. O implante precisa estar dentro do
campo eletromagnético de um leitor RFID [ou NFC]. Somente quando há um
acoplamento magnético entre o leitor e o transponder o implante pode ser
lido."
Ele acrescenta que não está preocupado em ter
seu paradeiro rastreado.
"Os chips RFID são usados em animais de
estimação para identificá-los quando estão perdidos", diz ele. "Mas
não é possível localizá-los usando um implante de chip RFID — o animal
desaparecido precisa ser encontrado fisicamente. Então todo o corpo é escaneado
até que o implante de chip RFID seja encontrado e lido."
No entanto, o problema com esses chips (e o
que causa preocupação) é se no futuro eles se tornarão cada vez mais avançados
e cheios de dados privados de uma pessoa. E se essas informações são seguras e
se uma pessoa pode de fato ser rastreada.
Theodora Lau diz que no futuro precisaremos saber qual o limite dos implantes — Foto: THEODORA LAU
A especialista em Tecnologia Financeira,
Theodora Lau, é coautora do livro Beyond Good: How Technology Is Leading A
Business Driven Revolution (Além do Bem: Como a Tecnologia Está Liderando uma
Revolução Impulsionada pelos Negócios, em tradução livre).
Ela diz que os chips de pagamento implantados
são apenas "uma extensão da internet das coisas". Ou seja, trata-se
de uma nova maneira de conectar e trocar dados.
No entanto, embora ela diga que muitas pessoas
estão abertas à ideia — pois tornaria o pagamento das coisas mais rápido e
fácil — o benefício deve ser ponderado com os riscos. Especialmente na medida
em que os chips comecem a carregar mais informações pessoais.
"Quanto estamos dispostos a pagar por
conveniência?" ela diz. "Onde traçamos a linha quando se trata de
privacidade e segurança? Quem protegerá a infraestrutura crítica e os humanos
que fazem parte dela?"
Nada Kakabadse, professora de Política,
Governança e Ética na Henley Business School da Reading University, também é
cautelosa sobre o futuro de chips mais avançados.
"Existe um lado sombrio da tecnologia que
tem potencial para abuso", diz ela. "Para aqueles que não amam a
liberdade individual, abre novas e sedutoras visões de controle, manipulação e
opressão. E quem é o dono dos dados? Quem tem acesso aos dados? E é ético
colocar chip em pessoas como fazemos com animais de estimação?"
O resultado, ela adverte, pode ser "o
desempoderamento de muitos para o benefício de poucos".
Steven Northam, professor de Inovação e
Empreendedorismo da Universidade de Winchester, diz que as preocupações são
injustificadas. Além de seu trabalho acadêmico, ele é o fundador da empresa
britânica BioTeq, que fabrica chips implantados wireless desde 2017.
Seus implantes são voltados para pessoas com
deficiência que podem usar os chips para abrir portas automaticamente.
"Temos consultas diárias", diz ele,
"e realizamos mais de 500 implantes no Reino Unido — mas a covid causou
alguma redução na procura".
"Essa tecnologia é usada em animais há
anos", argumenta. "São objetos muito pequenos e inertes. Não há
riscos."
Paumen também tem ímãs implantados em seus dedos — Foto: PATRICK PAUMEN
Na Holanda, Paumen se descreve como um
"biohacker" — alguém que coloca pedaços de tecnologia em seu corpo
para tentar melhorar seu desempenho. Ele tem 32 implantes no total, incluindo
chips para abrir portas e ímãs embutidos.
"A tecnologia continua evoluindo, então
continuo colecionando mais", diz ele. "Meus implantes aumentam meu
corpo. Eu não gostaria de viver sem eles", diz ele.
"Sempre haverá pessoas que não querem
modificar seus corpos. Devemos respeitar isso — e eles devem nos respeitar como
biohackers."
Por: BBC