Segunda-feira, 04 de julho de 2022
Matéria do Folhapress
Foto: Ascom
REINALDO
JOSÉ LOPES, SÃO CARLOS, SP (FOLHAPRESS) – O cardeal Cláudio Hummes, arcebispo emérito de
São Paulo, morreu nesta segunda (4), prestes a completar 88 anos.
Em nota em que confirmou o
falecimento, o arcebispo dom Odilo Scherer afirmou que o cardeal passava por
“prolongada enfermidade, que suportou com paciência e fé em Deus”.
Apontado como um dos principais
“candidatos a papa” do primeiro conclave do século 21, aquele que se seguiu à
morte de João Paulo 2º em 2005, o cardeal brasileiro acabou se tornando o
inspirador de um dos nomes papais mais surpreendentes da história da Igreja
Católica, o escolhido pelo argentino Jorge Mario Bergoglio, em 2013.
Hummes recontou a história da
seguinte maneira ao jornal italiano “La Stampa”: “Os votos convergiam para ele
[Bergoglio]. Ele estava muito introspectivo, silencioso. Quando as coisas
começaram a ficar um pouco mais perigosas para ele, eu o confortei. Depois,
houve o voto definitivo e começou um grande aplauso. Eu logo o abracei e
beijei. E lhe disse aquela frase, ‘Não se esqueça dos pobres’. Eu não tinha
preparado nada, mas naquele momento me veio do coração, com força, dizer-lhe
isso.”
É assim que dom Cláudio Hummes
provavelmente entrará para a história: como o cardeal que ajudou o novo papa a
escolher o nome Francisco, em homenagem ao “santo dos pobres” são Francisco de
Assis, na primeira vez que um pontífice se arriscou a usar essa designação.
Lembrar-se dos pobres e de são
Francisco foi algo extremamente natural vindo de um membro da ordem franciscana
(fundada pelo santo de Assis), como era o caso de Hummes.
Nascido em 8 de agosto de 1934
numa família de lavradores de origem alemã de Montenegro, interior gaúcho, Auri
Affonso Hummes se tornou Cláudio Hummes ao virar franciscano e receber a ordenação
sacerdotal, poucos dias antes de completar 24 anos.
Professor de filosofia em
seminários e universidades gaúchas, o frade se especializou na questão
ecumênica (o diálogo entre as várias igrejas cristãs) e ocupou cargos
importantes na estrutura de sua ordem e na CNBB (Conferência Nacional dos
Bispos do Brasil) nos anos 1960 e 1970.
Mas foi a partir de 1975, com
sua ordenação como bispo coadjutor de Santo André, na Grande São Paulo, que o
jovem prelado passou a entrar em contato com o movimento sindical de operários
da região, que tentavam se organizar em desafio às limitações impostas pela
ditadura militar.
Oferecendo espaços da diocese
de Santo André para que os operários pudessem se organizar, o bispo se tornou
amigo do metalúrgico e futuro presidente Luiz Inácio Lula da Silva, além de se
aproximar da Teologia da Libertação, corrente de pensamento que defendia a
união entre fé e compromisso social e político.
Apesar do uso, por parte do
governo militar, de algumas táticas de intimidação -como o sobrevoo de
helicópteros do Exército num estádio onde o bispo celebrava uma missa, em
1978-, a aliança entre o religioso e os militantes sindicais nunca chegou a ser
atacada frontalmente pela ditadura.
Com a democratização, o bispo
franciscano passou a ser um crítico dos abusos do capitalismo e da
globalização, antecipando, em parte, a pregação que o papa Francisco faria na
segunda década do século 21.
Ao mesmo tempo, por se manter
próximo da doutrina tradicional da Igreja Católica em temas envolvendo a
moralidade sexual, como o aborto e uso de anticoncepcionais, seu prestígio
durante o papado de João Paulo 2º se manteve intacto e até aumentou.
Tornou-se arcebispo de
Fortaleza em 1996 e, dois anos depois, arcebispo de São Paulo. Em 2001, recebeu
o chapéu de cardeal das mãos de João Paulo 2º, sendo convidado, no ano
seguinte, para conduzir os exercícios espirituais anuais promovidos pelo papa
(sua pregação na ocasião viraria um livro, intitulado “Sempre Discípulos de
Cristo”).
Embora tenha comemorado a
ascensão do PT ao poder e reiterado sua admiração por Lula, Hummes não hesitou
em criticar os escândalos de corrupção envolvendo o partido do então presidente.
Em sermão, chegou mesmo a
afirmar que o povo tinha razão em desenhar o rosto de políticos nos Judas
destruídos durante a tradicional malhação do Sábado de Aleluia, avaliando que,
ao chegar ao poder, o PT estava sendo menos zeloso do que se esperaria do partido
no combate às desigualdades sociais do país.
O corpo do cardeal será velado na Catedral Metropolitana de São Paulo, na Sé.
Por: Folhapress