Sexta-feira, 28 de Agosto de 2015
Julgamento responde a apelações semelhantes contra decisões que inocentaram réus em processos de estupro de vulnerável, sob alegação de "consentimento" das vítimas
Decisão do STJ reafirma legislação e orienta tribunais a não aceitar argumento de consentimento por menor de 14 anos
Relações sexuais ou qualquer ato libidinoso
entre adultos e menores de 14 anos é considerado estupro de vulnerável,
independente de a vítima consentir. A decisão foi tomada pelo Superior Tribunal
de Justiça, na terça-feira (25), de forma unânime, e passa a servir como
jurisprudência para os tribunais de todo o Brasil. O julgamento é uma resposta
a várias apelações semelhantes em todo o país, em processos de estupro de
vulnerável,contrariando decisões que foram baseadas na ideia de consentimento
das vítimas.
O recurso repetitivo foi apresentado
pelo ministro Rogério Schietti, da turma da 3ª Seção do STJ, após receber
pedido do Ministério Público do Piauí contestando a absolvição de um acusado de
estupro. Ele alegou manter um relacionamento amoroso com uma menina desde que
ela tinha 8 anos – hoje tem 18. Quando da denúncia ele tinha 25 anos e ela, 13.
No caso, a vítima e os familiares
dela confirmaram que havia um relacionamento. O Tribunal de Justiça do Piauí
absolveu o acusado, sustentando que a adolescente tinha discernimento e “nunca
manteve relação sexual com o acusado sem a sua vontade”. Para Schietti, nestes
casos, “o julgamento recai inicialmente sobre a vítima da ação delitiva, para,
somente a partir daí, julgar-se o réu”.
O ministro relator considerou que
qualquer ato sexual nessas condições é crime, não importando que a vítima
tivesse experiência sexual anterior ou se comprovasse um relacionamento amoroso
com o acusado. Schietti argumentou ainda que a evolução dos costumes e o maior
acesso de crianças e adolescentes a informação não se contrapõem à obrigação da
sociedade e da família de protegê-las.
O número de recursos sobre casos de
estupro de vulnerável no STJ cresceu cerca de 2.700% em cinco anos: de 6, em
2010, para 166, em 2014. A maior parte impetrada pelo Ministério Público, contra
decisões judiciais que consideraram que as relações foram consensuais. Todos os
casos desse tipo estavam suspensos aguardando a definição do STJ.
O ministro já havia se posicionado
contra a ideia de consentimento de menor de 14 anos na prática sexual. Relator
de um processo originado em São Paulo, em que um homem de 27 anos manteve
relações sexuais com uma menina de 11 e foi absolvido pelos desembargadores do
Tribunal de Justiça, Cruz enfatizou que o consentimento da criança ou
adolescente não tinha relevância na avaliação da conduta criminosa.
Para ele, os argumentos dos
magistrados paulistas eram “repudiáveis”. “É anacrônico o discurso que procura
associar a evolução moral dos costumes e o acesso à informação como fatores que
se contrapõem à natural tendência civilizatória de proteger certas minorias,
física, biológica, social ou psiquicamente fragilizadas”, diz um trecho do
relatório, de agosto do ano passado. O STJ manteve a condenação por quatro
votos a um.
Outros casos que ainda aguardam
definição devem ser influenciados pela decisão de terça. Também no TJ de São
Paulo, um fazendeiro da cidade de Pindorama foi absolvido da acusação de
estupro contra uma adolescente de 13 anos sob alegação de que ele não teria
como saber que ela era menor de idade em virtude do seu comportamento.
Acompanhado pela maioria dos
desembargadores da 1ª Câmara Criminal Extraordinária do TJ, o relator do caso,
que corre em segredo de Justiça, argumentou que “não se pode perder de vista
que em determinadas ocasiões podemos encontrar menores de 14 anos que aparentam
ter mais idade”.
E continuou: “Mormente nos casos em
que eles se dedicam à prostituição, usam substâncias entorpecentes e ingerem
bebidas alcoólicas, pois em tais casos é evidente que não só a aparência
física, como também a mental desses menores, se destoará do comumente notado em
pessoas de tenra idade”. O Ministério Público paulista recorreu da decisão e
aguardava o posicionamento do STJ.
Fonte: (RBA)