Domingo, 03 de agosto-(08) de 2025
Matéria de Mauren Luc com Folhapress
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Foto: Ascom/Jus |
A Polícia Civil do Paraná investiga um tipo de crime que está se
espalhando pelo país, o da maquininha adulterada de cartão, que envia a senha
da vítima para a quadrilha assim que digitada. Os golpistas, que agem como
falsos ambulantes ou motoristas por aplicativo, ainda trocam o cartão por outro
parecido, ficando com o original e a senha dos clientes.
Uma
única vítima teve prejuízo de R$ 28 mil em poucas horas. Golpes semelhantes
foram registrados também em São Paulo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
Em
Curitiba, a Delegacia de Estelionato tem em curso uma investigação sobre o
golpe. O delegado Emmanoel David diz que já foram apreendidas várias máquinas
adulteradas e presos três envolvidos, todos de São Paulo, com passagens por
estelionato.
O
Deic (Departamento de Investigações Criminais) de São Paulo identificou outros
quatro suspeitos e nove vítimas. “Foram apreendidas 17 máquinas de cobrança
adulteradas, além de diversos cartões bancários. As investigações continuam em
andamento”, informou a Secretaria da Segurança Pública paulista.
David
afirmou que o crime está se ampliando com algumas modificações. Além de
ambulantes na saída de eventos, falsos motoboys fazem entregas de presentes no
dia do aniversário da pessoa e pedem para ela pagar apenas o frete.
“Nesta
hora, dizem que a senha não foi aceita ou que não há sinal e que vão trocar a
máquina, momento em que substituem o cartão e enviam a senha digitada, por
bluetooth, direto para a quadrilha. São muitas vítimas”, disse.
Uma
delas foi a jornalista Maigue Gueths, de Curitiba, que ao tentar comprar
camisetas de ambulante na saída de um show foi informada que a máquina não
aceitava aproximação. Ela então colocou o cartão e digitou a senha.
“Ele
pegou a máquina com meu cartão e disse que não deu certo, que precisaria passar
na máquina da colega. Foi muito rápido. Ele pegou e já devolveu. Eu nem
conferi, o cartão era igual ao meu, coloquei na bolsa e fui embora.”
Era
domingo e ela só percebeu ter sido vítima de um crime na manhã do dia seguinte,
ao ter a senha bloqueada e descobrir que estava com cartão em nome de outra
pessoa.
Ela
disse que recebeu apenas uma notificação do banco no celular, de uma compra de
R$ 498. O total dos gastos dos golpistas, no entanto, foi de R$ 28 mil em
apenas um dia, incluindo débitos e créditos em mercados, postos de
combustíveis, lojas de roupas e até churros. Em apenas uma das transações o
valor foi de R$ 8.900.
“O
banco errou por não me alertar imediatamente, pois quase não uso o débito. Como
um cliente gasta R$ 10 mil de uma vez e ninguém avisa?”, questionou. “As
notificações estão todas ativadas, mas continuo não recebendo no celular, só no
aplicativo, que nem sempre abro.”
O
método de usar a distração do consumidor na saída de grandes eventos se repete
no Rio Grande Sul, onde um caso recente foi registrado pela Polícia Civil.
A
vítima foi um torcedor que saia do jogo de futebol lotado e comprou lanche num
ambulante. O golpista alegou problema na máquina, trocou rapidamente o cartão e
enviou a senha. Logo começaram as compras, que passaram de R$ 8.000, como conta
o delegado Filipe Bringhenti, do departamento de crimes cibernéticos, que
investiga o caso.
A
polícia de Santa Catarina também confirmou o registro de golpes semelhantes no
estado, mas não deu detalhes.
Outro
que caiu em golpe parecido foi o médico Thales Bretas, viúvo do humorista Paulo
Gustavo. Ele contou à TV Globo que foi vítima de um falso taxista no Rio.
DIFICULDADE
PARA RESSARCIMENTO
Geralmente
os bancos recusam o ressarcimento de gastos nestes casos, pois entendem que a
vítima fez a compra presencialmente com o cartão e aprovou com sua própria
senha, segundo o advogado Frederico Glitz, professor da UFPR (Universidade
Federal do Paraná) e pós-doutor em direito e novas tecnologias.
“Nos
contratos, a senha é intransferível, então o banco entende que existe uma
transação autorizada, sem possibilidade de ressarcimento”, disse.
Porém,
tudo depende do relacionamento do banco com o cliente. Nas compras por crédito
há mais alternativas, pois o pagamento pode ser suspenso. Ainda assim, os
bancos precisam ter mecanismos de segurança que identifiquem gastos fora do
padrão do cliente, como valores muito altos, fornecedores nunca contratados,
compras em outros estados, para fazer o bloqueio automático, conforme o
advogado.
“Há
decisões judiciais que obrigam os bancos a ressarcir as vítimas quando se
comprova que os gastos fugiram ao perfil do cliente, mas há decisões
contrárias.”
No
caso da jornalista vítima do golpe, após ter o ressarcimento negado pelo banco uma
vaquinha virtual chegou a ser criada por amigos, o dinheiro foi devolvido com a
intervenção do Procon.
A
coordenadora do órgão de defesa do consumidor no Paraná, Claudia Silvano, disse
que os bancos precisam ter mecanismos de segurança e alertar, mas que o
comportamento cuidadoso do consumidor ainda é a maior arma contra as
quadrilhas.
A
Febraban (Federação Brasileira de Bancos) informou que cada instituição tem sua
política de devolução, “baseada em análises individuais, considerando as
evidências apresentadas pelos clientes e informações das transações
realizadas”.
De
acordo com a entidade, os bancos gastaram, em 2024, R$ 4,2 bilhões em
cibersegurança e a previsão para este ano é de R$ 4,7 bilhões para o setor.
Segundo
o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, foram registrados 281,2 mil golpes
eletrônicos no ano passado, 17% mais que os 222,7 mil do ano anterior.
A
taxa é mais que o dobro de outros tipos de estelionatos, que aumentaram 7,8% no
mesmo período. O relatório mostra que casos de estelionatos por meio digitais
foram incluídos na legislação em 2021 e muitos estados ainda não os separam dos
demais tipos de estelionatos, o que dificulta os registros.
COMO
PREVENIR
Para
evitar esses golpes, as dicas da polícia e do advogado Glitz são reduzir o
limite dos cartões, ativando pelo aplicativo notificações de compras direto no
celular, por SMS ou WhatsApp, além de visualizar, no ato da compra, o valor
exibido na máquina antes de aproximar o cartão.
Ainda
conforme eles, é preciso ter cuidado com visores quebrados, rasurados ou com a
troca de máquinas, e o cliente não deve entregar o cartão a nenhuma pessoa, nem
perdê-lo de vista.
Outra
forma de segurança é contratar seguro contra roubos de cartões, mas é preciso
atenção, segundo Glitz. “Apólices podem excluir coberturas para este tipo de
crime. Então certifique-se que o seguro é o mais abrangente possível”, afirmou.
Desconfiar
de vendedores que afirmam faltar conexão à internet no local ou que dizem que a
máquina não aceita aproximação é outra medida necessária para os consumidores,
assim como, ao guardar o cartão, conferir se ele não foi trocado por outro.
Se
ainda assim o cliente cair em um golpe, é preciso bloquear com urgência o
cartão, registrar um boletim de ocorrência online e solicitar ao banco a
restituição dos valores, sendo possível recorrer ao Procon (Fundação de
Proteção e Defesa do Consumidor) ou à Justiça, ainda de acordo com o advogado.
Por: *
MAUREN LUC (FOLHAPRESS)