Segunda-feira, 29 de Fevereiro de 2016.
Uma grande gama de
fatores está contribuindo para o desaparecimento de animais polinizadores no
mundo todo, o que ameaça a produção de alimentos para o ser humano, revelou
nesta sexta-feira um relatório do organismo da Organização das Nações Unidas
(ONU) encarregado de proteger a biodiversidade.
O documento da
Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços de Ecossistemas
(IPBES) identificou uma série de medidas que governos e o setor privado
deveriam tomar de forma "urgente" para remediar o desaparecimento
animais como abelhas, borboletas e alguns mais complexos como as aves.
De acordo com o
vice-presidente do IPBES, Robert Watson, não existe um fator único que seja
responsável pelo desaparecimento dos polinizadores.
"Há uma série de
razões que explicam o declive, como a mudança do uso do solo, o uso de
pesticidas e a mudança climática. Não se pode dizer que há uma ameaça maior que
outra para cada animal polinizador ou para cada lugar do mundo onde estão
desaparecendo. É um conjunto de ameaças", disse ele à Agência Efe.
O relatório,
intitulado "Avaliação Temática sobre Polinizadores, Polinização e Produção
de Alimentos", é o primeiro feito pelo IPBES e é fruto de dois anos de
trabalho do organismo da ONU que foi fundado há quatro e é integrado por 124
países, incluindo o Brasil.
Existem milhares de
espécies que são polinizadoras, animais que transportam pólen do órgão masculino
de uma flor ao estigma, o órgão feminino, o que permite a fertilização. Nos
últimos anos, os cientistas observaram a alarmante queda da população de
abelhas, das que existem mais de 20 mil espécies silvestres, e borboletas,
especialmente na Europa Ocidental e na América do Norte, o que foi atribuído a
pesticidas e ao crescente uso de plantas modificadas geneticamente.
O relatório confirmou
que pesticidas, incluindo os neonicotinoides - quimicamente relacionados à
nicotina -, representam uma ameaça mundial para os polinizadores, apesar de
seus efeitos em longo prazo ainda não serem conhecidos.
O IPBES destacou a
importância econômica dos organismos polinizadores ao assinalar no estudo que
75% dos cultivos para alimentos do mundo dependem, pelo menos parcialmente, da
existência de polinizadores. O valor anual dos cultivos diretamente afetados
por polinizadores é estimado entre US$ 235 bilhões e US$ 577 bilhões.
"Os
polinizadores são grandes colaboradores da produção mundial de alimentos e
segurança nutricional", disse Vera Lúcia Imperatriz Fonseca, professora de
Ecologia no Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo e uma das
diretoras do relatório de IPBES.
Segundo ela, o
relatório "oferece opções sobre o que fazer de acordo com o problema específico
de cada lugar do mundo em relação aos polinizadores, a polinização e a produção
de alimentos". Entre as soluções estão a criação de uma maior diversidade
dos habitat dos polinizadores tanto no ambiente rural quanto no urbano, o apoio
a práticas tradicionais de rotação de cultivo e manutenção de áreas não
exploradas e a redução da exposição dos polinizadores a pesticidas.
O professor holandês
Koos Biesmeijer, um dos autores do relatório, reconheceu à Efe que existem
"vazios de conhecimento" com relação com a finalidade dos pesticidas
e outros fatores que impactam negativamente nos polinizadores.
"Embora não
saibamos tudo, em muitos casos, há claras conclusões", afirmou.
A professora da USP,
por sua vez, destacou a gravidade da situação.
"Deveríamos atuar
agora para deter o declive dos polinizadores", afirmou.
Já o vice-presidente
do IPBES acrescentou que todas as ações, desde as que podem ser tomadas por
agricultores até às que podem ser feitas pelos governos, poderiam começar o
quanto antes.
"Não precisamos
de novas tecnologias. Todas estas são opções que podem nos ajudar a sair na
frente", alertou.
Ele deu com exemplo o
efeito negativo que têm as grandes extensões de monoculturas.
"Necessitamos
uma agricultura mais sustentável. Eliminemos esses enormes extensões de
monoculturas e asseguremos que estão salpicadas com zonas de habitat natural
que atrairão os polinizadores nos campos de cultivo", concluiu.
IG