Domingo, 05 de novembro-(11) de 2023
Proposta tramita no Senado desde
2020; condição causa reações involuntárias, como espasmos, tiques, ruídos e
roncos
Síndrome
de Tourette afeta o sistema nervoso (Foto: Reprodução / Banco de Imagens
gratuitos)
Um projeto de lei em tramitação no
Senado pretende definir a síndrome de Tourette como deficiência, garantindo
todos os direitos previstos em lei para as pessoas com a condição. Os afetados,
que são cerca de 1% da população mundial, sofrem com tiques múltiplos — motores
e vocais. As informações são do R7, parceiro
nacional do Portal Correio.
Os tiques costumam ser de tipos diferentes e variam no decorrer de
uma semana ou de um mês para outro. A proposta, apresentada em 2020, está
aguardando votação da Comissão de Assuntos Sociais.
Caso o projeto
seja aprovado, quem é portador da síndrome terá acesso a direitos como
profissional de apoio escolar e acompanhante ou atendente pessoal em, por
exemplo, situações de internação em hospital. Pelo texto, os portadores da
síndrome deverão ser enquadrados como pessoas com deficiência para todos os
fins legais.
“É nítido que há
barreiras à plena inclusão social das pessoas com síndrome de Tourette, o que
as coloca em situação ontologicamente idêntica à das pessoas tipicamente
identificadas como tendo deficiências intelectuais”, justifica o autor da
proposta, senador Nelsinho Trad (PSD-MS).
O Estatuto da
Pessoa com Deficiência prevê que a avaliação da pessoa deve considerar fatores
como os impedimentos nas funções e nas estruturas do corpo; os fatores
socioambientais, psicológicos e pessoais; a limitação no desempenho de
atividades; e restrições na participação social.
“Propomos, então,
que as pessoas com síndrome de Tourette sejam formalmente declaradas pessoas
com deficiência, na acepção da Lei Brasileira de Inclusão, para que possam
gozar dos direitos e garantias nela previstos, o que as protegeria contra
discriminação e contribuiria para sua inclusão social”, afirma Trad.
A proposta já
recebeu parecer favorável da relatora na Comissão de Assuntos Sociais, senadora
Zenaide Maia (PSD-RN). “Reconhecemos a importância de assegurar os direitos das
pessoas com síndrome de Tourette. Trata-se, de fato, de uma afecção que impõe
várias barreiras aos que sofrem dela”, afirma a parlamentar.
“Embora pacientes
com síndrome de Tourette possam ser saudáveis e ter vida produtiva, a doença
não deixa de impor a eles grandes desafios clínicos, psiquiátricos,
comportamentais, sociais e ambientais”, completa.
Relatório pendente de votação
O relatório foi
apresentado em 18 de outubro na Comissão de Assuntos Sociais, mas, para que
seja votado, é necessário que o presidente do colegiado, senador Humberto Costa
(PT-PE), coloque o projeto em pauta. Se a matéria for aprovada, segue para a
Comissão de Direitos Humanos (CDH) em caráter terminativo. Isso significa que,
se não houver recurso e o texto for aprovado em ambas as comissões, não
precisará passar pelo plenário do Senado antes de ir para análise na Câmara.
Na Comissão de
Direitos Humanos, Zenaide quer realizar audiências públicas com o objetivo de
dar visibilidade ao tema. “A gente chama atenção não só da sociedade civil, mas
dos trabalhadores da saúde, lá na saúde primária, já que o diagnóstico é
clínico. É uma patologia e a gente tem que dar os mesmos direitos das outras
patologias neuropsiquiátricas”, afirmou a relatora ao JR
Entrevista, da Record News. A
parlamentar quer garantir aprovação do projeto em novembro.
Entenda a
síndrome
A síndrome de
Tourette é uma condição do sistema nervoso caracterizada por tiques que podem
variar de movimentos físicos à verbalização involuntária de palavras e frases
simples ou mesmo palavrões, conforme descreve o Centro de Controle e Prevenção
de Doenças (CDC) dos Estados Unidos.
Os tiques são
divididos em simples e complexos: o primeiro grupo envolve apenas algumas
partes do corpo e podem ser o ato corriqueiro de apertar de olhos ou a ação de
cheirar; já o segundo pode ter um padrão, como balançar a cabeça durante um
pulo ou um após o outro.
Além disso, os
tiques vocais podem ser atos, como cantarolar, limpar a garganta ou gritar
palavras e frases. São considerados raros os tiques que envolvem a utilização
de frases ou palavras inapropriadas, a chamada coprolalia. Apesar de a síndrome
ter caráter hereditário, as causas ainda são desconhecidas.
Os primeiros
sinais da síndrome costumam aparecer entre os 4 e 6 anos, intensificam-se por
volta dos 10 anos e costumam diminuir ao longo da adolescência até desaparecem
espontaneamente — o que ocorre na maioria dos casos.
Segundo dados da
Organização Mundial da Saúde (OMS), a síndrome de Tourette é uma doença rara,
que atinge cerca de 1% da população, com prevalência em crianças. Outras
doenças, no entanto, estão frequentemente associadas à condição, como o
transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) (22%–66%), transtorno de déficit de
atenção e hiperatividade (TDAH) (30% a 50%), ansiedade e depressão (57%),
distúrbios do sono (62%), transtorno episódico do controle dos impulsos (25% a
75%) e autolesão comportamental (33%–53%).
“Além dos tiques
motores e fônicos, várias outras manifestações podem se coadunar. Por exemplo:
transtorno obsessivo-compulsivo, depressão, ansiedade, déficit de atenção e
hiperatividade, distúrbios do sono, impulsividade. É uma síndrome caracterizada
por sintomas neurológicos e psiquiátricos”, explica o médico Osvaldo
Vilela-Filho, neurocirurgião do Instituto de Neurologia de Goiânia e chefe da
Divisão de Neurocirurgia do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina
da Universidade Federal de Goiás (UFG).
Na avaliação de
Vilela, há elementos suficientes para caracterizar pessoas com a síndrome como
portadores de deficiência. “A caracterização de deficiência não é muito
simples. Mas imagine uma pessoa que tenha tiques motores e fônicos, gritando,
emitindo palavras obscenas ou compulsões, que são rituais desencadeados por
pensamentos obsessivos. Claramente isso incapacita a pessoa para várias
atividades do dia a dia. Então penso que, de fato, a síndrome pode incapacitar
pessoas.”
Afeta as
crianças
Segundo o CDC, a
síndrome de Tourette pode afetar cerca de 20% das crianças, apesar de nem todas
serem diagnosticadas ou mesmo avaliadas com a condição. A incidência é maior
entre homens, com a proporção de três casos entre meninos para cada caso entre
meninas.
Para uma pessoa
ser diagnosticada com a condição, os tiques vocais ou motores precisam se
repetir por pelo menos um ano. O diagnóstico é clínico, e o tratamento, que
pode incluir intervenção comportamental e uso de medicamento antipsicótico,
pode ser indicado quando os tiques interferem na vida da criança.
Por: Com
Bruna Lima e Hellen Leite, do R7, em Brasília